Sai o chefe, entra o facilitador

Sai o chefe, entra o facilitador

Em 2011, após sua aquisição pelo grupo espanhol Iberdrola, a distribuidora de energia Elektro, com sede em Campinas, no interior paulista, deu início a uma revolução em sua liderança. Com o objetivo de tornar a gestão mais humana e aumentar o engajamento dos funcionários, a empresa percebeu que seria preciso trocar o modelo tradicional de liderança, com base em uma estrutura hierárquica e com decisões centralizadas, para chegar a um formato em que as pessoas se sentissem responsáveis pelos resultados. Para colocar esse conceito em prática, seria preciso mudar o perfil dos gestores da empresa. Líderes que antes davam ordens e estavam pouco disponíveis passaram a ter de se preocupar em explicar suas decisões e em conhecer os anseios dos subordinados. Na prática, a empresa trocou o perfil do chefe — alguém que tem uma posição de superioridade em relação às equipes e centraliza as decisões — pelo de um líder batizado de facilitador, cujo papel é organizar os vários times e se colocar à disposição deles para que os projetos sejam concluídos, e os resultados, alcançados. “Hoje, o líder não é mais o pilar, mas o óleo da engrenagem”, afirma Márcio Fernandes, presidente da Elektro. “O perfil antigo de liderança, em que manda quem pode e obedece quem tem juízo, não faz mais sentido para nós.” A nova cultura de liderança exigiu mudanças até na arquitetura dos escritórios, com a adoção de salas abertas para os gestores, para aproximá-los de sua equipe. Os líderes passaram por cursos em consultorias e ONGs para melhorar sua habilidade de comunicação e adotar uma postura mais aberta e humana.

Mas a mudança no modelo de gestão não aconteceu sem resistências. Para ter uma ideia, em 2012, 54 de 220 líderes deixaram a organização. “Algumas pessoas não se adaptam a esse sistema”, afirma Fabrícia Lani de Abreu, diretora de RH da Elektro. “Aquelas que queriam se manter como ‘chefes’ preferiram sair.” Na Mercur, fabricante de revestimentos e produtos para educação e saúde, como itens de papelaria, bolsas térmicas e muletas, de Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul, a necessidade de mudar veio após uma profunda revisão dos valores e da cultura da companhia, um processo
iniciado em 2009. “Nosso foco mudou de uma busca frenética por resultados financeiros para atitudes focadas em gente”, afirma Jorge Hoelzel Neto, do conselho de administração da Mercur. Fazer essa mudança exigiu decisões corajosas, como deixar de fornecer produtos para as indústrias do álcool e do jogo e adotar um modelo de gestão horizontal, em que o líder não fica num patamar superior, mas envolve as pessoas nas decisões e ajuda as equipes a trabalhar de forma integrada. “Quando você coloca os líderes como facilitadores, os funcionários se tornam protagonistas”, diz João Vogt, gestor de projetos da Mercur. “Isso muda toda a lógica do trabalho.” A exemplo do que ocorreu na Elektro, boa parte dos líderes não se adaptou. De sete diretores, apenas dois quiseram permanecer
depois do novo formato. “Perdemos aqueles que estavam acostumados a
mandar”, afirma Jorge Hoelzel Neto.

Tempo de resposta
Embora os motivos que geram a mudança no modelo de liderança variem
segundo a empresa, o contexto que as explica é o mesmo. As companhias
sentem necessidade de reduzir o tempo de resposta para o mercado — e vêm percebendo que os processos não fluem rapidamente em estruturas rígidas e verticalizadas. A inspiração para o novo modelo vem das empresas
de tecnologia, cujas equipes são compostas de pessoal qualificado e organizadas numa estrutura horizontal, em que o conhecimento se complementa e o líder responsável varia conforme o tipo de projeto.

O novo perfil de liderança também é uma adaptação à sociedade atual em que os profissionais são mais questionadores e exigem uma liderança mais aberta e participativa. “Algo incompatível com a liderança tradicional, em que o poder fica concentrado em poucas pessoas”, diz Fabrícia, do RH da Elektro. Para Rafael Souto, presidente da Produtive, consultoria de planejamento e transição de carreira, de São Paulo, os profissionais que não se adaptarem a esse modelo perderão boas chances de emprego, já que nas empresas mais inovadoras não há espaço para gestores autoritários. “É uma exigência do mercado atual”, diz Rafael.